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Sentença

 

Conclusão: 10/05/2022

Processo: 117.12.BELSB 



A Autora, 


FLORBELA BETÃO, nascida em 04.05.1967, portadora do número de CC 55555555, com residência na Avenida da Liberdade DIRETORA DA FACULDADE DE ARQUITETURA ENQUANTO REPRESENTANTE DESTA INSTITUIÇÃO,



Intentou uma ação administrativa de impugnação de ato administrativo e ressarcimento, 



Contra, 

O MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, através do DR. MANUEL SILVA, Director dos Serviços de Assessoria Jurídica e Contencioso do Ministério das Finanças, detentora do Cartão de Cidadão nº 1334522; e MANUEL MARIA FEIO CORDEIRO detentor do Cartão de Cidadão nº 145254321;

 

A Autora requer,  i) a determinação do ato administrativo como ilegal e consequentemente a sua anulação, ii) que a Administração Pública elabore um novo despacho e que inclua também o financiamento do Centro de Investigação para Estética dos Edifícios Públicos, da Faculdade de Arquitetura. 



I - FUNDAMENTAÇÃO 


DOS FACTOS 


Com base na análise crítica dos documentos juntos aos autos (documentos esses os que foram juntos com a Contestação e os documentos apresentados pela Autora aquando da realização da audiência de julgamento) e  com recurso  à prova testemunhal julgam-se provados, com interesse para decisão, os seguintes factos: 


  1. Foram apresentados vinte e dois   projetos pelo Ministério da Ciência e do Ensino Superior.

  2. O Ministério das Finanças dispunha de uma verba para dotar um ou mais projectos de investigação superior.

  3. Tais projetos estavam em igualdade de circunstâncias.

  4. Apenas 1 desses projetos, o da criação do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita (CIVC), que pertencente ao Instituto Superior da Economia da Realidade (ISER), mereceu admissão por parte do júri constituído internamente na Secretaria Geral da Ciência e Educação e, consequentemente, despacho favorável do Ministro das Finanças, Manuel Cordeiro.

  5.  A fundamentação para a admissão e exclusão de propostas foi devidamente apresentada no relatório preliminar e final apresentado pelo júri.

  6. Manuel Cordeiro pertencia ao quadro docente da instituição, ISER.

  7. Tanto o ISER como a Faculdade de Arquitetura são universidades públicas.

  8. Foi proferido um despacho, utilizando a dotação especial do Ministério das Finanças para o apoio a projetos nacionais já detentores de financiamento europeu, mas necessitados de cofinanciamento nacional para a sua concretização, foi atribuído um montante de 8 milhões de euros ao Centro de Investigação Verdadeiramente Catita.

  9.  O Centro de Investigação Verdadeiramente Catita tinha recebido uma subvenção de 5 milhões de euros, no âmbito do projeto europeu Portugal 2020.

  10.  O caso chegou ao conhecimento público, aquando da aprovação do Orçamento de 2022.

  11.  Nessa mesma altura, soube-se também que o responsável pela elaboração das normas orçamentais, e antigo titular da Pasta das Finanças, retornara à respetiva instituição universitária como vice-Reitor. 

  12.  O Centro de Investigação para Estética dos Edifícios Públicos, da Faculdade de Arquitetura, não havia sido contemplado pelo ato administrativo.

  13.  Florbela Betão é a diretora da Faculdade de Arquitetura.

  14.  O vice-Reitor participou no procedimento.

  15. Todos os projetos tinham já recebido financiamento europeu.


Com base na análise crítica dos documentos juntos aos autos (documentos esses os que foram juntos com a Contestação e os documentos apresentados pela Autora aquando da realização da audiência de julgamento) e  com recurso  à prova testemunhal julgam-se não provados, os seguintes factos: 


  1.  O Ministro não só aprovou o financiamento de um projeto, como rejeitou o de todos os outros, ato este implícito. 

  2.  O despacho proferido não terá sido devidamente fundamentado. 

  3.  O fundamento para a prática do ato de escolha daquela instituição em detrimento das outras ter sido apenas por “necessidade da subvenção para não se perder o apoio europeu”. 

  4.  A grande razão porque o Ministro escolheu este projeto foi para que, em troca, lhe atribuíssem o cargo de vice-Reitor no ISER.

  5.  O Ministro esteve presente nas inúmeras reuniões que ocorreram para debater este assunto na sala de conferências do Ministério da Educação. 

  6.  Foi também o Vice-reitor que elaborou o despacho e que proferiu a decisão final. 

  7.  O projecto  vencedor já tinha recebido financiamento europeu, tendo sido o que mais dinheiro recebeu.

  8.  Não houve audiência dos interessados. 











Relativamente às ilegalidades materiais e procedimentais invocadas pela defesa da Autora cumpre a este tribunal pronunciar-se relativamente a:


A alegada incompetência

O vínculo da competência existe sempre, porque sem ele nenhum órgão pode atuar caso não haja previsão legal (se o fizerem, gera-se a ilegalidade).
A incompetência pode ser definida como "o vício que consiste na prática, por um órgão administrativo, de um ato incluído nas atribuições (ou competência) de outro", segundo o professor Diogo Freitas do Amaral.
Para que estejamos perante esta, é necessário que se verifique uma invasão de um órgão (que praticou o dito ato) à esfera própria de outra autoridade administrativa, mas sem sair do âmbito do poder administrativo.
É possível distinguir 2 tipos de incompetência: se se trata de um órgão a atuar no quadro das mesmas atribuições, falamos de incompetência relativa. Já se atuar no quadro da competência de outro órgão, incompetência absoluta (prevista no artigo 161º/2 alínea b) do Código do Procedimento Administrativo). Assim, faz-se com que cada competência seja atribuída com certo fim (que deve ser seguido sob pena de ser ilegal).
A defesa da Autora veio alegar, na sua Petição Inicial, que foi o Ministro das Finanças quem tomou a decisão de escolher os projetos que deviam ser financiados por razões de mérito, ao escolher apenas um deles e ignorando os demais, invadindo as competências do Ministro da Educação. Fruto de uma notícia avançada pela comunicação social, a Autora confundiu o Ministro da Educação com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Tendo sido decorrida (a reunião) na Secretaria-Geral da Educação e Ciência, compete-lhe (ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior), atendendo ao artigo 24º/5 da Lei Orgânica do Governo, exercer a direção sobre esta. Foi nesta que se constituiu o júri que, mais tarde, viria a selecionar os projetos para participarem no concurso para financiamento do Ministro das Finanças. A Autora não teve o cuidado de averiguar a veracidade da notícia (incorreta) que lhe fora transmitida.
Mas não é o único equívoco em que incorre: após o júri ter selecionado apenas 1 projeto para ser financiado pelo Ministro das Finanças - o do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita - este proferiu um despacho favorável à concessão de fundos, de acordo com a decisão final tomada pelo júri encarregue de selecionar o(s) programa(s) vencedor(es). Não se verifica qualquer falta de competência, por parte do Ministro das Finanças, nos atos por si praticados.
Posto isto, o Tribunal concluiu não haver qualquer falta de competência, já que todo o processo de formação, execução e decisão (do concurso para financiamento do Ministro das Finanças) ocorreu dentro da normalidade prevista na lei. A deliberação da Autora julga-se improcedente.


O dever de fundamentação

A fundamentação de toda e qualquer atuação administrativa implica que o titular do órgão decisor que profere a decisão é responsável por apresentar um raciocínio coerente, lógico e suficientemente justificado, de modo a não deixar dúvidas à parte que, eventualmente, sofrerá com essa mesma decisão - atenda-se ao artigo  152º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, mas também ao artigo  268º/3 da Constituição da República Portuguesa .
Nos dias de hoje, a jurisprudência tem por mais ou menos unânime que uma decisão se apresenta como fundamentada quando um destinatário normal, colocado na posição do real destinatário, possa ficar esclarecido e tome consciência do sentido e razões de ser da decisão que o afete, sendo que não é necessário que tenha conhecimento de todos e quaisquer motivos da mesma, mas tão só os seus motivos determinantes - a base da questão, aquilo que foi absolutamente indispensável para a medida ter sido tomada de certa forma e não de outra. A violação deste dever é dos vícios mais comuns do ato administrativo.
Os júris da Secretaria-Geral da Educação e Ciência emitiram um relatório que fundamentava o afastamento de todas as candidaturas (exceto a do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita).
Ainda que se tenha de atender de igual forma ao artigo 153º do Código do Procedimento Administrativo, o artigo  152º/2 vem, no caso em específico, assumir maior relevância: a decisão de atribuir o financiamento do Ministro das Finanças deriva de uma deliberação tomada por júri, pelo que se insere no caráter excecional do artigo 152º do Código do Procedimento Administrativo.
Mais ainda: o ato praticado pelo Ministro das Finanças revelou-se como meramente confirmatório (de uma decisão levada a cabo pelo júri da S7GEC), e não decisório, pelo que não se aplica o artigo  153º do mesmo Código.
O Tribunal entende não haver coerência lógica na justificação apresentada pela Autora, pelo que considera não ter havido qualquer tipo de violação do dever de fundamentação.


 Princípio da imparcialidade

O princípio da imparcialidade está consagrado no artigo 266º nº2 da Constituição e no artigo 9º do Código do Procedimento Administrativo, que determina que a Administração  deve tratar de forma imparcial aqueles que com ela entre em relação.

         Este princípio estabelece a necessidade da Administração  atender aos interesses públicos e privados de forma ponderada, sem permitir que os seus próprios interesses particulares interfiram no procedimento. Este princípio tem duas vertentes: uma negativa e uma positiva. No que diz respeito à vertente negativa, a imparcialidade estipula que os titulares de órgãos e os agentes da Administração Pública estão impedidos de intervir em procedimentos ou que digam respeito a questões do seu interesse pessoal atos ou contratos que digam respeito a questões próprias do seu interesse pessoal, familiar, ou pessoas com que tenham tido especial proximidade, sob pena da sua conduta ser desviada do desejado. Isto ocorre de modo que não exista a suspeita de parcialidade sendo o por isso o dever de não intervir em certos assuntos consagrados novamente nos artigos 69 e seguintes do Código do Procedimento Administrativo.  

         Em relação à vertente positiva, esta determina que a Administração  tem a obrigação de antes de tomar uma decisão, realizar uma ponderação de todos os interesses públicos e privados relevantes no caso. Assim seriam considerados parciais os atos que não resultem desta ponderação dos interesses juridicamente protegidos.

         Em casos de violação do princípio da imparcialidade, como ocorre numa situação de intervenção de um o órgão/agente impedido de intervir ou em relação ao qual se tenha declarado suspeição, o desvalor associado é anulabilidade, nos termos do artigo 76º/1 do Código do Procedimento Administrativo. Para além disso, assim como refere o nº2 deste artigo, no caso do órgão ou agente administrativo não comunicar uma situação de impedimento em que se encontre, este incorre em falta disciplinar grave.

         Em gesto de síntese, a imparcialidade proíbe que os órgãos da Administração intervenham em certos procedimentos administrativos, ou tomem certas decisões, para evitar a suspeita de que estejam a atuar de forma parcial. O que pretende não é a justiça das decisões proferidas pela Administração Pública  , mas antes o afastamento de razões que possam colocar em causa a imparcialidade dos órgãos competentes para a tomada de decisão.

         Cabe agora aferir se as alegações da Autora correspondem, ou não, de facto, a uma violação do princípio da imparcialidade. A Autora começa por referir que o atual Ministro das Finanças, o Dr. Manuel Cordeiro, era o atual vice-reitor da única universidade que recebeu financiamento do Estado, invocando por isso a suspeição do mesmo, com base no artigo 73º/2 do Código do Procedimento Administrativo, referindo, que os órgãos do poder público devem agir sem ter qualquer tipo de interesses adicionais diretos na matéria. Refere, ainda, que o Ministro das Finanças deveria ter pedido escusa, pois não só era, à data, docente da universidade, como vice-reitor da mesma. Termina dizendo que "é óbvio" que acaba por privilegiar o projeto apresentado pela sua universidade, pedindo a anulabilidade do ato, como prevê o artigo 76º do Código do Procedimento Administrativo.

         Ora, cabe ao Tribunal reforçar aquilo que já foi, por várias vezes, referido anteriormente - a decisão de escolher o(s) projeto(s) merecedor(es) de financiamento por parte do Ministro das Finanças coube, única e exclusivamente, ao júri constituído pela Secretária-geral da Educação e Ciência, sendo que o dito Ministro não fazia parte do júri nem influenciou esta decisão, meramente a homologou, não tendo participado no processo decisório.

         Ainda que não tenha apresentado nenhum facto ou prova daquilo que defendeu, a Autora teria indubitavelmente razão se o Ministro das Finanças tivesse participação e influência direta na escolha do(s) vencedor(es) do projeto por si financiado, mesmo que se estivesse a falar de um, ou mais, projetos que não o da sua instituição. Porém, e por várias vezes já abordado, este não foi o caso: o Ministro apenas aprovou a decisão do júri, em nenhuma circunstância a influenciou.

         Quanto a este tópico, o Tribunal decide não dar razão ao alegado pela Autora, não tendo havido violação do princípio da imparcialidade pelos motivos supramencionados.

Os particulares deverão ser ouvidos numa altura em que o tal projeto ainda não existe, de forma a reforçar o alcance constitutivo da decisão final. Claro fica, que a audiência ocorre antes de ser tomada a decisão final 


Quanto ao Princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos 

Este princípio encontra-se previsto no artigo 4º do Código do Procedimento Administrativo e está consagrado constitucionalmente no artigo 266º da Constituição da República Portuguesa , apontando para a vinculação da atuação administrativa. As autoridades administrativas, mesmo no uso de poderes discricionários, não podem prosseguir qualquer finalidade. O poder discricionário apesar de ser uma realidade que permite a realização de escolhas, está limitada e sujeita a princípios jurídicos, nomeadamente o princípio da prossecução do interesse público- Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa, anotada, vol. II, 3º edição, página 922.

         A prossecução do interesse público é assim um componente essencial da legalidade a que a Administração Pública está sujeita. Importa mencionar também que a delimitação do interesse público requer sempre uma tarefa de interpretação da legalidade aplicável e um juízo de ponderação de forma a alcançar uma decisão que se apresente equilibrada e principalmente benéfica tendo em conta o interesse geral.” À Administração Pública importa, portanto, não apenas respeitar a lei que lhe outorga as competências e demarca em menor ou maior medida o conteúdo da respetiva atuação, mas também os direitos e interesses legalmente protegidos” - Luiz S. Cabral Moncada, in Código de Procedimento Administrativo, anotado, 3ª edição, página 81.

         A defesa da Autora invoca a violação deste princípio por considerar que a decisão tomada tem em vista a prossecução de um interesse que é privado e que tem como único objetivo beneficiar a carreira do ex-Ministro das Finanças e atual vice-reitor do ISER, Manuel Cordeiro. A defesa da Autora fundamenta ainda que a escolha de atribuir financiamento a apenas um dos vinte e dois   candidatos que se apresentaram em concurso prejudica, deste modo, o interesse público.

         Analisemos então a questão levantada. Parece evidente que a escolha de conceder fundos a um conjunto de projetos se insere no âmbito do exercício discricionário de quem tem a competência para fazer esta escolha - o júri - e, como visto anteriormente, este é um poder que não se pauta pela livre escolha administrativa, mas sim por critérios legais e princípios jurídicos que limitam e balizam as opções da Administração Pública. Assim sendo, para que este princípio se encontre violado é necessário que aquando da decisão, esta tenha sido tomada ignorando os critérios e princípios jurídicos que vinculam a atuação administrativa.

         A escolha de atribuir financiamento a um só projeto num conjunto de vinte e dois viola, por si só, o princípio da prossecução do interesse público? Importa relembrar que esta decisão está sujeita a limites, desde já, estabelecidos pelo Caderno de Requisitos, sendo que, desta forma, a discricionariedade da decisão estaria sempre limitada por estes requisitos e critérios, não estando, portanto, perante uma decisão arbitrária. Encontrando-se toda a atividade administrativa subordinada à prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, a discricionariedade não se traduz numa liberdade pela Administração  de escolher uma qualquer solução entre as várias que existem, mas antes na escolha, de entre as várias soluções que a lei previu, daquela que substância, no caso concreto, a melhor e mais oportuna solução jurídica do ponto de vista do interesse público - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo nº 030183. Assim de forma a responder à questão, conceder financiamento apenas a um projeto num conjunto de vinte e dois, neste caso, não consubstanciou a violação do princípio da prossecução do interesse público, uma vez que foi seguido o Caderno de Encargos, não havendo arbitrariedade nesta decisão, tendo sido também considerado que esta escolha era a que permitiria um maior benefício para o interesse geral. Não era por atribuir a mais do que um projeto o financiamento em causa que isso implicaria um benefício maior para o interesse público.


Da alegada violação do Princípio da Igualdade 

“A  igualdade é pressuposto fundamental da noção de justiça. Exprime um a priori  universal que postula o respeito pelo direito de cada um. Integra a noção de justiça cumulativa e de justiça distributiva. A primeira tem um significado negativo que consiste em não tratar de modo desigual aquilo que é idêntico (dever de não agir) a segunda um significado positivo que consiste em tratar de modo desigual aquilo que não é idêntico (dever de agir). A igualdade compreende assim a discriminação positiva ou a favor consoante a posição relativa de cada um desde que fundamentada em razões subtanciais que justificam a diferença de tratamento para melhor. Através da discriminação a igualdade deixa de ser apenas formal e transforma-se em igualdade material” Luiz S. Cabral Moncada, in Código de Procedimento Administrativo, anotado, 3ª edição, página 90.

         No ponto 30 da Petição Inicial a Autora alega a violação deste princípio consagrado pelo artigo 6º do Código do Procedimento Admnistrativo, contudo, e quando analisadas as várias dimensões da igualdade observa-se que a escolha de uma universidade em vez de outra se prende com vários critérios objetivos devidamente definidos e não apenas na discricionariedade como consta da prova documental anexa à Contestação. 


Da alegada violação do Princípio da Boa Administração

        O princípio da boa Administração  encontra-se consagrado no artigo 5º do Código do Procedimento Administrativo, assim como no artigo 41º da carta dos direitos fundamentais da União Europeia.

         Este princípio consagra o dever de a Administração prosseguir o interesse público da forma mais eficiente possível, sendo que para o fazer a Administração Pública deve seguir os critérios de eficiência, economicidade e celeridade, elencados no artigo 5º nº1 do Código do Procedimento Administrativo  Em primeira instância, o critério de eficiência exige que a atividade administrativa seja capaz de atingir os objetivos que assumiu prosseguir. Só assim estaremos perante uma boa Administração . No entanto, a atuação da Administração  ser eficiente não é condição suficiente, é ainda necessário que estejam verificados os critérios de economicidade e celeridade, ou seja que a Administração  deve ter em vista uma gestão equilibrada dos recursos públicos, tendo como objetivo gastar o menos possível, e que o tempo de decisão e de atuação da Administração Pública deve cingir-se ao estritamente necessário para atingir os fins que assumiu prosseguir.

         A Autora alega a suposta violação dos critérios de eficiência, economicidade e celeridade, que constituem o princípio da Boa Administração, defendendo que ao receber oito milhões de euros do estado português para além da subversão de cinco milhões de euros da União Europeia, o Centro de Investigação Verdadeiramente Catita estava a ser financiado de forma excessiva e estava a dispor fundos que poderiam ser utilizados para outros projetos.

         Entende-se que todos os vinte e dois  projetos tinham recebido financiamento europeu, pelo que o motivo apresentado pela Autora de que ao receber financiamento europeu e financiamento do estado estaríamos perante um financiamento excessivo não é válido, pois, todos os projetos tinham esse requisito cumprido. Em relação ao valor da proposta em si, entende-se que este foi atribuído de forma a garantir os fundos necessários para o cumprimento dos objetivos apresentados pelo Centro de Investigação Verdadeiramente Catita.

         Um problema que poderia vir a ser suscitado era a possível violação do princípio da proporcionalidade, na medida que poderia ser considerado desproporcional atribuir oito milhões de euros ao Centro de Investigação Verdadeiramente Catita após este já ter recebido cinco milhões. A questão da possível violação do princípio da proporcionalidade vai ser tratada adiante.

         Assim, entende-se que a atribuição de oito milhões de euros ao Centro de Investigação Verdadeiramente Cativa não constitui uma violação do Princípio da Boa Administração.

 

 

 

Princípio da Boa-Fé e da Confiança 

Consagrado no artigo 10º do Código do Procedimento Administrativo e podendo aplicar-se em variadas dimensões, o Princípio da Boa-Fé assume-se como um dos princípios gerais, que servem de fundamento ao ordenamento jurídico. Tal princípio apresenta-se como um dos limites da atividade discricionária da Administração representando a obrigação, tanto dos particulares quanto da Administração Pública, de observarem os valores fundamentais do Direito e os seus padrões éticos nas respetivas condutas, atendendo especificamente às expectativas suscitadas na contraparte e aos objetivos que a mesma visa atingir com a atuação que levou a cabo.

       Impondo-se, tanto à Administração Pública quanto aos administrados, este princípio consagra uma dupla dimensão: a) Confiança suscitada na contraparte – refere-se primariamente à Administração Pública que, por regra, é quem atua, podendo criar expectativas legítimas na contraparte. Tem o dever de não adotar depois atuações incoerentes, frustrantes da tal confiança; b) Objetivos a visar com a atuação pretendida - refere-se aos particulares, já que os objetivos da Administração Pública estão consagrados na lei.

       O princípio da boa-fé, norma, inclusive, enunciada no nº 2 do artigo 266º da Constituição da República Portuguesa, obriga a Administração a exercer a sua função através dos seus agentes e órgãos, atuando com observância a conteúdos que expressam lealdade, retidão, honestidade e seriedade. Demanda-se assim, que o comportamento da Administração seja honesto, leal e simultaneamente, espera-se por parte dos particulares, reciprocidade.

       O cuidado e as precauções a exigir, da parte que reivindica a proteção da sua boa-fé, serão tanto maiores, quanto mais avultado for o investimento feito ,com base na confiança, já que se não pretende tutelar o "excesso de confiança".

       Posto isto, existem dois princípios concretizadores da boa-fé, são eles: o princípio da primazia da materialidade subjacente e o princípio da tutela da confiança.

O primeiro, tem a sua positivação no artigo 6º do Código do Procedimento Administrativo, pelo que aquilo que se encontra aqui implícito é que deve "ponderar-se o objetivo visado com a atuação empreendida," ou seja, a Administração  estando adstrita ao princípio da boa-fé não poderá aproveitar-se de uma ilegalidade cometida por um particular para alcançar um objetivo, visando os meios mais prejudicados.

       A boa-fé é importante, sobretudo enquanto tutela da confiança de um particular. Um particular, que está perante um ato administrativo, tem o direito de confiar na Administração . A boa-fé, conduz a regras especiais que estão no artigo 165º e seguintes: regras que proíbem que a Administração  mude de opinião sem motivo ou razão, impossibilidade de efeitos retroativos e havendo um direito do particular, este tem de ser salvaguardado.

       Assim, o princípio da confiança tem como pressupostos: atuação de um sujeito de direito; situação de confiança justificada; investimento de confiança; nexo de causalidade; frustração da confiança. A verificação destes pressupostos e consequentemente a violação do princípio da tutela da confiança, acarretam a responsabilidade civil. O interessado, não pode alicerçar a fundamentação da violação do princípio da confiança na mera convicção psicológica, têm de se impor a enunciação de sinais exteriores produzidos pela Administração, suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde seja razoável ancorar a invocada confiança.

       A tutela da confiança representa um mecanismo de amparo das expectativas geradas pela Administração, quanto à sua própria forma de proceder. Espera-se que a atividade administrativa siga uma determinada lógica, por ela estruturada, de modo a evitar que o desempenho da Administração sofra alterações drásticas e injustificadas, que podem prejudicar os interesses dos cidadãos.

       Isto não significa que a Administração Pública não possa alterar o seu entendimento e consequentemente, a sua conduta em determinadas situações jurídicas. As modificações podem ocorrer desde que não prejudiquem direitos já consolidados e que tais circunstâncias de mudança se acomodem à persecução do interesse público.

Há ainda que ter em conta que boa-fé, não representa um princípio absoluto ou soberano. O seu conteúdo pode ser relativizado, limitado, ou até mesmo submetido, em caso de conflitos com outros princípios que sejam considerados primordiais.

       Como referido anteriormente, o Princípio da Boa-Fé implica uma atuação por parte da Administração Pública, leal, honesta, séria e informada.

       A Autora afirma ter havido violação deste princípio por parte da Administração Pública, uma vez que não existiu a devida justificação para a escolha do projeto do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita e consequentemente, para a exclusão dos restantes projetos. O presente tribunal dá como provado que a fundamentação, para a admissão e exclusão de propostas, foi devidamente apresentada no relatório preliminar e final apresentado pelo júri, uma vez que tanto o relatório preliminar como o final foram apresentados e nestes era feita referência aos requisitos, assim como às razões pelas quais o projeto da faculdade de arquitetura e demais projetos, não foram escolhidos para receber financiamento.  Ainda, há que ressalvar que o réu Manuel Cordeiro, não tinha obrigação de justificar a decisão de proferir despacho de autorização de saída dos fundos para o financiamento do projeto, uma vez, que apenas se tratava de um ato de homologação de uma deliberação tomada pelo júri, escolhido pela Secretária-geral da Educação e Ciência e como tal, ao abrigo do nº2 do artigo 152º do Código do procedimento Administrativo ,não tinha obrigação de o fazer.

       Existe assim, base justificativa para a decisão do júri e consequentemente ,para a decisão de proferir despacho, autorizando a saída do financiamento para o centro de Investigação Verdadeiramente Catita, não havendo uma ilegalidade material aqui cometida.

       A Autora alega ainda a violação da confiança que as Faculdades depositaram na Administração Pública, pois esta não seguiu o interesse geral da sociedade, seguindo os seus próprios interesses.

       A confiança não se pode basear numa mera convicção psicológica, têm de se impor sinais exteriores produzidos pela Administração Pública ,suficientemente concludente e onde seja razoável ancorar a invocada confiança. Assim, o princípio da confiança tem como pressupostos os seguintes: atuação de um sujeito de direito; situação de confiança justificada; investimento de confiança; nexo de causalidade; frustração da confiança. Falha, desde já o pressuposto do nexo de causalidade, uma vez que não existe concordância entre a decisão do Ministro e a frustração por parte da Autora. Mesmo a frustração da confiança não é justificável, uma vez que nunca é dito que o projeto da Faculdade de Arquitetura será escolhido para receber financiamento, nem tal decisão foi considerada tomada por critérios que não sejam legítimos e justificáveis, como é alegado pela Autora.

       Visto não se verificarem os pressupostos acima referidos, não se considera ter existido violação do princípio de confiança. A decisão tomada pelo júri foi feita com base em critérios objetivos e não com base em critérios de foro pessoal. Deste modo, não existe aqui nenhuma violação material deste princípio, assim como do princípio da boa-fé, não existindo lugar a Responsabilidade Civil.

 


No que ao Princípio da Justiça e da Razoabilidade diz respeito 

Cumpre esclarecer que estes princípios encontram-se estabelecidos no artigo 8º do Código do Procedimento Administrativo e consagrados no artigo 266º, nº2 da Constituição. Apesar de existirem de forma conjunta na epígrafe do artigo 8º do Código do procedimento Administrativo, são distintos e, portanto, serão analisados por este tribunal como tal.
Ora o princípio da justiça remete para a existência de critérios materiais de decisão, ou seja, a necessidade da Administração Pública pautar a sua atuação por critérios materiais ou de valor constitucionalmente plasmados, como o da dignidade da pessoa humana, estabelecido no artigo 1º da Constituição da República Portuguesa; o princípio da efetividade dos direitos fundamentais, consagrado no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa ; o princípio da igualdade, estatuído no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa  e  por último o princípio da proporcionalidade que se deduz do artigo 18º da Constituição da República Portuguesa .
O princípio da justiça vem, desta forma, sintetizar a contribuição dos princípios gerais que a Administração deve ter em conta em todos os momentos do procedimento e não apenas no resultado material. A observância dos critérios materiais em cima enunciados deverá resultar numa “solução justa”, como dizem Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa, anotada, vol. II, 4ª ed., pág. 801, 802.
Ora, a defesa da Autora fundamenta a violação deste princípio por considerar que a decisão se baseia em critérios “ilógicos” levando a uma decisão “ilógica” - a de atribuir o financiamento apenas a um dos vinte e dois   candidatos. No entanto, a decisão de financiar apenas um dos vinte e dois   candidatos que se apresentaram em concurso, não corresponde por si só à violação do princípio em causa, para tal seria necessário que a coletividade encarregada de avaliar o mérito dos candidatos ignorasse os critérios elencados supra. A decisão de atribuir fundos apenas a uma instituição, deixando de fora as restantes, teve como base um Caderno de Requisitos, que foi seguido e respeitado pelo júri responsável. Assim, a decisão tomada, não implica a violação do princípio da justiça apenas por só um dos candidatos ter recebido o financiamento, visto que, foi o único considerado merecedor dos fundos segundo o Caderno de Encargos e este foi seguido por um júri, à partida, apto e idóneo para a tomada da decisão em causa.
Quanto ao princípio da razoabilidade cumpre dizer que este tem que ver com um domínio que não tem natureza valorativa, mas sim com a adequação aos factos, é um critério de aplicação de normas administrativas e permite avaliar a bondade dos argumentos utilizados em prol da situação concreta e da solução administrativa encontrada. Este princípio não corresponde a uma ideia abstrata, como se pode pensar inicialmente. Para que seja cumprido é necessária uma ponderação, à semelhança do que acontece com o princípio da proporcionalidade, mas em vez de uma ponderação que se reporta a aspetos substanciais, reporta-se a aspetos mais lógicos.
O princípio da razoabilidade é, portanto, útil para promover uma solução em casos de indeterminação ou de liberdade discricionária (como este), sendo também um critério que permite a concretização da ideia de direito. É através deste que é possível valorar as atuações administrativas reportadas aos casos concretos, sendo o seu objetivo último chegar a uma decisão e solução razoável
Ora, a defesa da Autora fundamenta a violação deste princípio por considerar que a decisão de terem atribuído os vencimentos apenas ao Centro de Investigação Verdadeiramente Catita e nada terem atribuído aos restantes candidatos, consubstancia uma decisão “desrazoável” e “absurda,  incompatível com a ideia de Estado de Direito Democrático”.
Vejamos, a decisão de financiar um candidato e de não financiar os restantes coube ao júri, decisão essa que tem de seguir os requisitos que se encontram estabelecidos no já mencionado Caderno de Requisitos. Assim, o processo de verificar se os candidatos cumprem com os pressupostos já implica uma avaliação e uma ponderação por parte de quem toma a decisão. Mais se acrescenta, o financiamento não tem de ser concedido a mais do que um candidato do concurso, não havendo problemas de ilegalidade material em outorgar os fundos apenas ao Centro de Investigação Verdadeiramente Catita  , no caso desta decisão respeitar e cumprir com o princípio da razoabilidade. Entende-se, então, que uma decisão razoável não passa, portanto, pela atribuição igualitária dos fundos ou até pela atribuição a mais que um dos candidatos, passa sim por uma ponderação entre o interesse público e o benefício que advinha com a escolha dos candidatos a financiar. Desta forma, se o júri considerou, tendo em conta o preenchimento dos requisitos que constavam do Caderno de Requisitos, que apenas o Centro de Investigação Verdadeiramente Catita   era merecedor dos fundos e que esta decisão permite o favorecimento do interesse público, não há violação do princípio da razoabilidade.
Entende-se, pela fundamentação apresentada, que a conformidade da decisão com os princípios da justiça e da razoabilidade está fora de qualquer dúvida. 


Violação do princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade é um princípio material inerente ao regime dos direitos liberdades e garantias. Este princípio está consagrado no artigo 18 nº2 e no artigo 266 nº2 da Constituição da República Portuguesa, assim como no artigo 7º do Código do Procedimento Administrativo.

         Freitas do Amaral define  o princípio da proporcionalidade como «o princípio segundo o qual a limitação de bens ou interesse privados por atos dos poderes públicos deve ser adequada e necessária aos fins concretos que tais atos prosseguem, bem como tolerável quando confrontada com aqueles fins».

         Este princípio consagra a ideia de proibição do excesso, realçando a importância de uma relação equilibrada entre meios e fins. O princípio da proporcionalidade desdobra-se em 3 subprincípios: o princípio da adequação, que determina que as medidas restritivas legalmente previstas devem ser adequadas para a prossecução dos fins visados por lei; o princípio da exigibilidade que aponta para a necessidade das medidas restritivas previstas na lei, isto é que os fins visados pela lei não possam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos dos particulares; e ainda o princípio da proporcionalidade em sentido restrito, este impede a adoção de medidas desproporcionais, excessivas em relação aos fins obtidos - Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa, anotada, vol. II, 3º edição, página 392 - 393.

A defesa da Autora entende que ocorre uma violação do princípio da proporcionalidade no âmbito do princípio da adequação e da proporcionalidade em sentido estrito, concluindo que há uma violação do fim, pois a Administração Pública deve adotar os comportamentos adequados aos fins prosseguidos. A Autora entende que o objetivo do financiamento destes projetos era beneficiar as várias faculdades e os projetos que os alunos viessem a desenvolver.

         O fim da atribuição de financiamento pelo estado português era o de garantir que os projetos nacionais já detentores de financiamento europeu que necessitavam de cofinanciamento nacional para a concretização dos projetos recebiam esse apoio, e que esses projetos fossem desenvolvidos de forma plena. A decisão foi feita por um júri tendo em conta as exigências presentes no caderno de requisitos, pelo que o projeto do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita   era o único que os cumpria de forma inequívoca, como fundamentado no relatório preliminar e final. Assim, o projeto do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita   foi o selecionado.

         Os meios adotados pela Administração são por isso adequados ao fim que visa prosseguir, pelo que não pode ser alegada uma violação do princípio da adequação.

         Pode ser ainda levantada a questão sobre a violação do subprincípio da proporcionalidade em sentido restrito, na medida que poderia ser considerado desproporcional atribuir oito milhões de euros ao projeto do Centro de Investigação Verdadeiramente Catita após este já este já ter recebido cinco milhões.

         Como já referido a atribuição dos oito milhões de euros teve por base a quantia indicada na proposta de modo a assegurar a prossecução e concretização dos interesses apresentados pelo Centro de Investigação Verdadeiramente Catita, não podendo ser por isso considerada excessiva. Caso o fosse iria contra as normas contidas no caderno de requisitos no qual se baseou a decisão do júri, pelo que não teria sido o projeto selecionado para o cofinanciamento.

         Desde modo, não é possível concluir que existe por parte da Administração uma violação do princípio da proporcionalidade.

Quanto à audição dos particulares 

Carece de uma aprofundada análise por este tribunal a questão apresentada pela Autora a respeito do Direito de Audiência Prévia. É alegado por esta que este Direito não foi respeitado pela Administração resultando numa violação do princípio da participação resultando também num vício de procedimento uma vez que constitui uma fase fundamental do procedimento.

         Ora, cumpre a este tribunal apreciar esta questão à luz do princípio da participação consagrado no artigo 12º do Código do Procedimento Administrativo entendido por parte da doutrina como uma manifestação do direito fundamental de audiência dos particulares. Este direito está simultaneamente previsto no artigo 267 nº 5 da Constituição da República Portuguesa . A Administração tem que ouvir o particular, tem que conhecer a sua posição de modo a que quando chegue o momento da tomada de decisão possa considerar o que este pensa. A lógica é a de que um particular não pode ser alvo de uma situação se não for ouvido, ou seja, para o Prof. Vasco Pereira da Silva trata-se de um instituto que assegura a proteção dos particulares no procedimento, uma exigência de um Estado de Direito, e se afigura como um instrumento democrático de formação da vontade da Administração. Como direito fundamental, posição adotada por este tribunal a audiência prévia corresponde a uma formalidade essencial, sendo o seu cumprimento decisivo para a formação do ato administrativo final influenciando de perto o seu conteúdo. Assim sendo, a preterição da audiência prévia gera a invalidade do ato final, correspondendo-lhe o desvalor jurídico mais grave, a nulidade e não apenas a anulabilidade.  

A Autora alega a inexistência de Audiência Prévia, contudo, quando analisado o testemunho do Sr. João Silva e a prova documental apresentada pelos Réus, concluiu-se que de facto houve lugar a audiência prévia. O Sr. João da Silva testemunhou, em sede de julgamento, que recebeu o relatório preliminar em que foi anunciada a sua exclusão do concurso. Este foi-lhe enviado por via eletrónica (e-mail) e foi ainda publicado no site oficial da Secretaria Geral da Educação e Ciência, nesta sequência, João da Silva pronunciou-se ao abrigo da audiência prévia por entender injusta a decisão de manter de fora do concurso o seu projeto. O júri competente para a avaliação do mérito dos candidatos ao presente concurso responde mantendo a sua posição. Daqui se retira que existiu, efetivamente, um direito de audiência prévia e que este foi exercido nos termos e em conformidade com a lei.

         Nos termos do artigo 121º do Código do Procedimento Administrativo os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final. O período de audiência prévia começou a decorrer após a publicação do Relatório Preliminar no sítio da internet da SGCE, na plataforma de submissão de candidaturas e enviado para os e-mails das instituições registados na plataforma concursal utilizada, assim sendo nos termos do artigo 122º do Código do Procedimento Administrativo deu-se a notificação de todos os interessados. Os Réus juntaram com a sua Contestação documentos comprovativos como um Relatório Preliminar (com especial relevância o Ponto nº 5 deste) bem como um resumo sumário da Audiência Prévia.

         A Autora entregou aquando da audiência de julgamento uma prova em formato de e-mail com a qual pretendia demonstrar que tinha tentado requerer o exercício do seu direito. Contudo, quando analisado o conteúdo da prova concluiu-se que deste não constava a data do e-mail e que o mesmo estava dirigido para um endereço de e-mail incorreto, não sendo esta prova tida como relevante. Não estando a prova datada não tem este Tribunal capacidade para aferir se teria este pedido sido concretizado no prazo estipulado de 10 dias para o efeito.

         Face ao exposto, conclui o presente tribunal que a audiência prévia foi devidamente notificada, que de facto existiu e que por isso as pretensões da Autora são tidas como improcedentes não se provando nem a violação do Princípio da Participação nem um vício de procedimento. 

Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal do Círculo de Lisboa em:


Considera-se não procedente o pedido de anulação do presente ato administrativo e consequentemente não se dá precedência ao segundo pedido da Autora. 


Custas pela Autora, 


Registe e notifique.


Lisboa, 10 de Maio de 2022.


Os Juízes de Direito,

Francisca Grandela, 

Gilberta Carvalho, 

Lourenço Chambel, 

Rita Bento,

Rita Reigadas.


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