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Resolução da hipótese prática

 

Simulação de Direito Administrativo II

Margarida Gomes 140120024

 

            O Ministro da Defesa, Michael von Grass da Silva, foi obrigado a demitir-se na sequência de um escândalo quanto à obtenção do respetivo grau de Doutor, que a comunicação social vinha noticiando há cerca de um ano, mas que só agora foi investigado pela Inspeção-Geral do Ensino Superior, que concluiu pela sua ilegalidade. Em causa, estava tanto a verificação de um alegado plágio no conteúdo da tese de doutoramento, como a verificação de irregularidades várias na parte escolar do doutoramento, em que todos os créditos, menos um, das disciplinas frequentadas tinham sido obtidos através de reconhecimento de atividade profissional considerada equivalente e em que a única disciplina, a que se submetera a exame final, tinha sido realizada através da prestação de uma prova oral, quando o regulamento da Universidade exigia a realização de um elemento escrito de avaliação.

            A pedido do Ministro da tutela, a Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC) realizou uma inspeção à Universidade Lusitânia Expresso, o estabelecimento de ensino superior privado, com sede em Santarém, onde o Ministro obtivera o doutoramento, nos termos dos artigos 148.º e 149.º do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), aprovado pela Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro. No âmbito dessa inspeção, a IGEC, apesar de ter detetado diversas irregularidades em distintos processos, conclui apenas no sentido da nulidade do doutoramento do Ministro, alegando sobretudo argumentos formais.

            Ouvidos em sede de audiência prévia, os órgãos diretivos da Universidade Lusitânia Expresso vieram invocar, entre outros aspetos, a autonomia académica, pedagógica e científica, bem como o facto de todas as situações encontradas terem ocorrido há mais de três anos e se terem, por isso, convalidado.

            O Ministro da Educação e Ciência homologa a decisão da IGEC e solicita ao Ministério Público que use da ação pública, a fim de obter a declaração de nulidade do grau de Doutor de Michael von Grass da Silva. Este, por sua vez, considera que o resultado da inspeção é ineficaz, por não ter sido previamente ouvido.

            Quid iuris?

N.B. – Trata-se de uma hipótese meramente académica, pelo que qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência. A hipótese deve ser resolvida tendo em conta os conhecimentos adquiridos em Direito Administrativo II, não sendo consideradas autonomamente questões de natureza processual. Os fatos constantes da hipótese devem ser dados como provados, os demais resultam da prova testemunhal, feita pelas partes. As partes devem procurar chegar previamente a um acordo mínimo sobre os fatos considerados relevantes, de modo a permitir uma maior (e melhor) discussão das questões substantivas.


Resolução

O presente caso prático apresente três problemas jurídicos relevantes que carecem de análise, em primeiro lugar teremos que analisar o desrespeito pelas normas plasmadas no regulamento da universidade; em segundo lugar teremos que analisar o procedimento administrativo levado a cabo pelo Ministro da Tutela (que tutela as o ensino superior) será, pois o ministro da ciência e do ensino superior e por fim o ato administrativo resultante deste procedimento.

Começando por analisar a violação do disposto no regulamento da faculdade, é de primordial importância dizer que os regulamentos administrativos estão previstos nos artigos 135º e ss do CPA podem ser definidos como as “normas jurídicas emanadas no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou por entidade publica ou privada (como no caso sub judice) para tal habilitada por lei (art. 135º CPA, e no presente caso é habilitada pela lei 62/2007). Tornando, deste modo, os regulamentos como fonte de Direito Administrativo, nas palavras de Freitas do Amaral são uma fonte secundária de Direito, constituindo um produto da atividade administrativa impensável o funcionamento do Estado moderno, tendo em consideração a quantidade de entidades, serviços e órgãos que integram a administração indireta e autónoma do estado que o auxiliam na prossecução das suas atribuições. Esta noção de regulamento pode ser divida em três elementos: elemento material: o regulamento consiste em normas jurídicas gerais e abstratas, distinguindo-se assim dos atos administrativos (explicados infra); elementos orgânico-formal: em regra, os regulamentos são emanados de um órgão de uma pessoa coletiva pública da administração; mas podem sê-lo por entidades públicas que não integram a administração (ex. parlamento, como no caso em analise, foi a AR que habilitou as universidades privadas para a realização de regulamento lei 62º/2007 - ) ou por entidades privadas; elemento funcional: o regulamento é emanado no exercício do poder administrativo. Quanto as várias espécies, neste caso temos um regulamento independente (autónomos) são “aqueles que os órgãos administrativos elaboram no exercício da sua competência, para assegurar a realização das suas atribuições especificas” , neste sentido e olhando a lei 62/2007 temos disposto no seu artigo 140º que diz: “ a entidade instituidora do estabelecimento de ensino superior privado deve dotá-lo de estatutos (...)”– neste sentido a lei limita-se a definir a competência objetiva e subjetiva, havendo liberdade de a administração definir o conteúdo normativo em causa, como se pode ver na segunda parte do artigo supra referido.

Quanto ao objeto temos um regulamento de organização, no caso, da universidade; quanto âmbito de aplicação e institucional, aplicando-se a comunidade escolar da universidade e interno ou seja a sua eficácia limita-se a esfera jurídica da entidade de que emana.

Importa ainda fazer referencia a diferença entre lei e regulamento, esta distinção e tratada sobretudo por dois autores que adotam posições distintas: por um lado temos o professor Marcello Caetano, influenciado pela doutrina administrativa alemã que sugere que a distinção entre a lei e o regulamento passa pela primeira deter deter uma dimensão de novidade a nível de regulação jurídica que os regulamentos não possuem. Contudo, como assiná-la Freitas do Amaral, in curso de direito administrativo II, 2018 – Almedina, pp. 160-161, os regulamentos independentes criam uma disciplina jurídica nova, inovadora, cuja validade depende somente de uma lei habiloitação e não de um ato legislativo que preveja expressamente a necessidade de regulamentação de um determinado aspeto.

A segunda tese é sustentada pelo professor Freitas do Amaral, e refere que devemos ponderar mais critérios para distinguir lei de regulamentos, pois materialmente podem ser praticamente indistinguíveis. Consequentemente, serão relevantes critérios orgânicos e formas para destrinçar as figuras: lei será todo o ato normativo que provenha de um órgão com competência legislativa e que assuma a forma de lei e regulamento todo o ato normativo emanado de órgão com competência regulamentar e que revista a forma de regulamento. Explicada a base teórica, importa olhar ao caso concreto, ora a universidade havia feito um regulamento de forma cumprir o pp da legalidade previsto no art. 3º do CPA e de forma regulamentar todo o funcionamento do estabelecimento de ensino, inclusive o seu método de avaliação e programa curricular, ora tendo este regulamento eficácia interna, aplicar-se-á a todos só seus alunos, onde se inclua o então ministro, desta forma, o percursos e obtenção do título de doutor é completamente anormal face ao estabelecido no regulamento e por essa havia constitui uma ilegalidade por violação de uma norma clara, norma esta com eficácia e validade, e assim esta violação, desrespeito pela norma/s consubstancia-se numa ilegalidade como veredito dado pela entidade fiscalizadora do estado, em cumprimento do previsto e estabelecido no D.L. 125/2011 (lei orgânica do ministério da educação e ciência) – art. 11º, nº1.

De seguida, temos o inicio do procedimento administrativo, ora os procedimentos administrativos estão definidos no art. 1º do CPA e é a sequencia juridicamente ordenada de atos e formalidades tendentes à preparação e exteriorização da prática de um ato da administração ou à execução. Ora, devemos olhar este artigo 1º em concomitância com o art. 267º da CRP que nos dá os grande objetivos da regulamentação jurídica do procedimento administrativo, divididos sobretudo por dois prismas: garantir a melhor ponderação da decisão a tomar à luz da lei e do interesse público e, por outro lado, salvaguardar os direitos subjetivos e os interesses legítimos dos particulares. Os procedimentos administrativos obedecem a uma serie de princípios fundamentais que englobam os princípios gerais da administração pública (art. 3º- a 10º do CPA) aliados a alguns específicos do procedimento como o caráter documental, simplificação do formalismo, natureza inquisitória , da desburocratização e eficiência, colaboração da AP com os particulares, direito da informação dos particulares, participação dos particulares na formação da decisão, gratuitidade, proteção dos dados pessoais, cooperação legal com a UE, tendo por inferindo que estes princípios foram cumpridos no presente procedimento, comecemos a olhar à espécie de procedimento que aqui temos presente: temos, segundo art, 53º do CPA um procedimento de iniciativa pública, tendo em consideração que foi a AP que tomou a iniciativa de desencadear, no caso, temos que foi o ministro que tutela o ensino superior, no caso o ministro da educação e ciência (à data, hj, ministro da ciência, tecnologia e ensino superior), que através dos órgãos de fiscalização, previsto no art. 11 do D.L 125/2011 – inspeção geral da educação e ciência; quanto ao objeto é um procedimento decisório tem como  objetivo a pratica de um ato da administração, sendo um procedimento comum e com natureza sancionatório.

Olhando, agora as fases do procedimento, numa fase inicial dá-se o inicio do procedimento, no caso foi iniciado pela administração, sendo que devera ser comunicado as pessoas cujos direitos ou interesses legalmente protegido possam ser lesados pelos atos a praticar (art. 110º CPA), no presente a IGEC deveria comunicar o inicio do procedimento a faculdade, bem como ao ministro (tendo o caso do mm o motivador desta diligencia e que o próprio poderia sair lesado pela inspeção), esta notificação devera cumprir a forma e formalidade previstas no números 111º e ss do CPA. De seguida, temos a fase da instrução onde a AP, no caso a IGEG, ao abrigo dos artigos 115º a 120º ira recolher toda a matéria de facto e de direito relevantes a tomada de decisão, através de provas documentais, testemunhais, qq meio de prova – art. 115º (mutandis mudandis, tendo em consideração que não ser ao próprio do ministro , mas a equipa de inspeção habilitada legalmente para tal). Depois de recolhidas as provas caberão ao diretor da instrução, no caso, o ministro da tutela, averiguar todos os factos cujo conhecimento seja adequado à tomada de uma decisão legal e justa dentro de um prazo razoável (art. 115º, nº 1, do CPA). Encontra-se aqui uma manifestação do pp da legalidade (art. 3º do CPA + 266º/ da CRP)  e do principio da justiça (art. 8º CPA ‘+ 266º/2 da CRP), bem como uma manifestação do dever de celeridade (art. 59º CPA).

De seguida, e tida como a terceira fase do procedimento, consequência do tradicional direito de defesa, é regulada nos artigos 121º - 125º do CPA, e constitui o campo primordial de aplicação de dois princípios gerais regulados no Código: o principio da colaboração da administração com os particulares (art. 11º, nº 1 do CPA) e o principio da participação (art. 12º do CPA), acresce ainda que a audiência prévia, como refração do princípio da democracia participativa, vem consagrada na constituição no art. 267º, nº 5 do CPA.

Nesta fase, será então assegurado o direito de os interessados participarem na formação de decisões que lhes digam respeito, ser anest afase que os particulares passarão a conhecer o projeto de decisão e e dizer/acrescentar algo relevante para o processo de decisão, deverão ser chamados todos os interessados, ou seja, partes lesadas/beneficiadas pelo projeto de decisão, ora no presente caso, e tendo em consideração que a ISEG tinha previsto declarar a nulidade do doutoramento do ministro pro uma preterição absoluta da forma de avaliação, que deveria ter sido feito pela forma escrita e foi feito pela forma oral, este deveria ter sido chamado, tendo em consideração que não foi ato administrado, regulado no art. 148º e ss do CPA,e tido como uma decisão tomada no exercício de poderes jurídico administrativo (competência atribuída pelo art. 12 da dl. 125/2011) que visa produzir efeitos jurídicos externos, numa situação individual e concreta, como e o caso, anular a obtenção de grau de doutor do ministro, ou nas palavras de feitas do amaral: “ato jurídico unilateral, praticado no exercício do poder administrativo, por um órgão da administração ou por outra entidade publica ou privada para tal habilitada por lei e que traduz a decisão de um caso considera pela AP, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta”, desta forma e pelo incumprimento desta formalidade prevista no art. 121º do CPA, o ministro tem razão e poderá querer a nulidade do ato por vicio de formada forma de preterição total do procedimento legalmente exigido (consequência prevista no art. 161, nº 1 do CPA) e desta forma a nulidade fara com que o ato praticado pela IGEc e posteriormente homologado pelo ministro da tutela não produz efeitos ab initio (art. 162º/1 do CPA), e esta pode ser pedida a todo o tempo pelo particular afetado, poderá ser reconhecimento extra ou judicialmente, ou seja, o particular poderá requer o reconhecimento d anulidade do ato para tribunal administrativo (art. 162/2 do CPA) ou poder ser reconhecida por qualquer órgão administrativo (art. 134º do CPA), desta forma a nulidade poderá vir a ser declarada com eficácia erga homens (externa/ contra a terceiros) pelos tribunais administrativos, em se de ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo (art. 50º/1 do CPTA) ou pelo órgão administrativo competente, no caso o ministro da educação e ciência que não deveria ter homologado o ato, e dever rever essa homologação – o que originará um novo ato administrativo para reconhecer tal facto -art-. 162º/2, ou então, o MP aquando do envio por parte do ministério poderá reconhecer a invalidade do ato que lhe fora remetido. 

               Em suma, a questão ada ilegalidade primeiramente arguida pela IGES, esta correta e bem feita, já o procedimento administrativo iniciado pelo ministro da tutela, vem a resultar numa ato invalido pela pretiração de uma formalidade legalmente exigida que gera a nulidade por si praticado, invalidado a declaração de nulidade do doutoramento do ministro que assim, para todos os efeitos é válido ate que um novo procedimento valido e eficaz venha a demonstrar o contrário.


 

 

 

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