Toda a teoria é o resultado de uma realidade histórica.
A teoria dos vícios do ato administrativo baseava-se no modo como no Direito Português eram entendidas as ilegalidades do ato administrativo.
A doutrina da teoria dos vícios do ato administrativo dividia as ilegalidades em cinco vícios:
- usurpação de poder: correspondente ao excesso de poder
- incompetência (absoluta ou relativa)
- vício de forma
- desvio de poder
- violação de lei (diferente de "violação da lei", porque, em rigor, tudo isto correspondia à violação da lei, mas não à violação de lei)
Esta teoria deixou de existir em Portugal nos anos 80.
Nenhuma das realidades é verdadeira nem se verifica, portanto, nos dias de hoje - hoje em dia, o Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), quando fala dos requisitos da petição inicial no seu artigo 78.º, apenas exige a indicação do pedido - o que o autor vai solicitar ao juiz - e a causa do mesmo - os factos que mostrem que os direitos do particular foram violados. Não é, portanto, necessário que se alegue algum dos vícios.
O Professor Vasco Pereira da Silva afirma que esta teoria é ilógica e irracional.
É ilógica porque, se a explicação deste elenco tem a ver com elementos essenciais do ato administrativo - como afirmam os seus defensores -, então esperar-se-ia que cada um destes aspetos correspondesse a um elemento essencial desse ato administrativo. Se olharmos para os dois primeiros vícios, estes têm a ver com o mesmo elemento do ato administrativo - a competência.
É também irracional, devido ao facto de o procedimento - que é elemento essencial de qualquer ato administrativo - não ser considerado na teoria do vício. Por isso, a doutrina começou a incluir as violações das regras de procedimento na violação de forma - o procedimento acabava por gerar um vício de forma. Mas a forma também é, em si, um elemento essencial do ato.
Quanto aos elementos materiais, começou a distinguir-se o desvio de poder, porque considerava-se que o poder discricionário não era igual ao poder vinculado. Hoje em dia, estes poderes são duas dimensões da ilegalidade - não há nenhum vício específico nem do poder discricionário nem do poder vinculado. É uma distinção, portanto, inadmissível.
O Professor Gonçalves Pereira dizia ainda (e bem, segundo Vasco Pereira da Silva) que distinguir o desvio de poder da violação de lei não fazia sentido, porque em ambos os casos estava em causa o mesmo requisito material.
Acerca do último vício - o da violação de lei - Marcello Caetano afirmava que este vício era subsidiário, ou seja, quando houvesse dúvidas quanto a qualquer vício, estas caberiam nesta formulação - funcionava como um "caixote do lixo".
Esta teoria tradicional dos vícios não está hoje, sequer, consagrada em nenhuma norma legislativa - isto representa um argumento suplementar para que esta teoria não seja aplicada nos dias de hoje. O legislador ordinário nunca mais elencou estes vícios, tornou-se desnecessário utilizar a teoria dos vícios - logo, não há razão para fazer a distinção presente na teoria.
A única lei que faz referência a dois - e apenas dois - dos vícios, mas sem elencar a teoria dos vícios é o artigo 161.º/1, alínea a) e e), Código do Procedimento Administrativo (CPA), que refere, respetivamente, a usurpação de poder e o desvio de poder.
Hoje em dia, esta teoria dos vícios tornou-se ilegal e contrária à ordem constitucional - uma posição defendida pelo Prof. Vasco Pereira da Silva. Mas, na prática, os juízes e advogados continuam a usar os vícios do ato administrativo - uma realidade que não tem justificação nem do ponto de vista lógico nem do ponto de vista da ilegalidade (talvez seja o peso da tradição ou os traumas da infância difícil do Direito Administrativo). Em rigor, nada disso é necessário - o que o particular tem de fazer é invocar o pedido e a causa deste e o juiz tem de os reconhecer (artigo 53.º e ss., CPA).
Bibliografia:
Aulas teóricas do Professor Vasco Pereira da Silva
Margarida Machado (n.º 140120026) - turma 1/A
Comentários
Enviar um comentário